Preconceitos.
Pela primeira vez na minha vida fui alvo de preconceito. Sempre tive sorte em não ser discriminada, sou uma mulher branca heterossexual num país relativamente desenvolvido. Acho que me safo bastante bem no que toca a preconceitos por isso não estava de todo à espera do que me aconteceu hoje.
Todos os dias utilizamos os transportes públicos para chegar onde precisamos. Eu apanho todos os dias o comboio para o mesmo destino da mesma forma que milhares de pessoas o fazem. Entro, vou para o sítio mais livre de pessoas (claustrofobia é lixada) e sento-me num lugar vago ou fico em pé à espera que alguém saia nas próximas estações. Acho que a maioria das pessoas faz isso, não é nada de especial.
Hoje ia em pé, entretida a jogar pokémon go, quando uma senhora se levantou para sair. Eu aproveitei e sentei-me porque vocês estão fartos de saber o que passo todos os dias com o meu corpo. Acordo cansada, deito-me cansada, tenho dores, o corpo pesa, etc. É normal, eu tenho fibromialgia.
Sentei-me num lugar que não era prioritário. Sentei-me porque apanhei a oportunidade, porque queria e acima de tudo porque precisava. Só que isso não importa para nada, não é?
Como eu pareço uma pessoa perfeitamente saudável tive logo que ouvir uma troca de comentários desagradáveis de duas mulheres com idade para terem juízo. "Sinceramente", "isto realmente", algo do género as pessoas não têm a noção.
Eu respondi, com educação e a voz baixa que lá por ser nova não significa que não precise do lugar apesar de não me terem sequer deixado acabar a frase. Fui atacada como se tivesse acabado de cometer um crime atroz, mandaram-me calar, humilharam-me e mandaram-me voltar para o meu jogo como se eu fosse uma criança.
Tentei explicar à senhora, que directamente queria o lugar só porque é mais velha (apesar de também parecer saudável) que eu tinha fibromialgia e nem sei o que ia dizer mais porque a bruxa virou a cara como se eu fosse lixo e mais uma vez a outra mulher que tem mais ou menos a minha idade atacou-me.
Eu não dei o lugar porque preciso dele. As pessoas não sabem mas eu sei. Eu tenho a doença, eu lido com ela todos os dias. Eu esforço-me 24 horas por dia para ter uma vida normal e fingir que não me dói da ponta do cabelo à ponta dos dedos dos pés.
Ninguém me defendeu porque a humanidade já se perdeu completamente. Eu era a má da fita. Num comboio cheio em hora de ponta ninguém se levantou para dar o lugar a uma pobre senhora que nem sequer pediu e eu fui a má da fita.
Já agora, um facto interessante sobre a lei: os maiores de 65 anos só têm prioridade aos lugares se demonstrarem incapacidades físicas e/ou mentais. Isto parece irónico porque eu não apresento sinais físicos de doença mas isto é só para saberem a lei.
Eu não cheguei e exigi um lugar. Apenas fui mais rápida, estava no meu direito. Vocês que conhecem um bocado sobre mim sabem que eu tenho sentido de solidariedade. Gosto de ajudar as pessoas.
Hoje fizeram-me sentir pequenina, pequenina, pequenina.
Escusado será dizer que fui a viagem toda a chorar e a soluçar em silêncio sem me conseguir controlar. Tive meia hora a chorar sem parar porque na minha cabeça não me fazia sentido ser injustiçada daquela forma quando as pessoas nem sabiam o que estavam a dizer.
Eventualmente acalmei-me (com ajuda da mamã; sou uma mimada) e preocupei-me com as aulas. O dia passou e eu já não choro mais mas é um sentimento de revolta enorme que guardo dentro de mim ao saber que para o resto da minha vida as pessoas vão olhar e achar que sou saudável quando por dentro estou a batalhar tanto para não cair.
Estou cada vez mais desiludida com o ser humano. Quanto mais conheço dele, mais gosto do meu cão.
Mas não liguem, esta gente nova é que é mal educada.