Estou oficialmente com o maior peso que alguma vez estive na minha vida e de quem é a culpa? Minha, como é óbvio!
Nos últimos dois ou três meses desisti de quaisquer dietas e deixei as minhas emoções controlarem a minha vontade de comer. Acontece que as minhas emoções não são nada simpáticas para mim e não anseiam coisas saudáveis como uma saladinha ou beber muita água. Não, elas querem é bolos, chocolates, pudins, nuggets, pizza, um "ganda" hamburguer do McDonald's, um pacote inteiro de Oreos mergulhadas no leite.
Nada disto me faz sentir bem ou estar efectivamente. Na verdade, assim que acabo de comer sinto-me mal porque estou mal disposta e porque sinto que falhei comigo própria. Sinto-me mais deprimida e que não consigo ser responsável e dizer que não àquilo que não quero.
Aquele conforto que queremos ter quando comemos coisas destas é momentâneo e acontece única e exclusivamente enquanto as nossas papilas gostativas estão a sentir todo o açúcar ou gordura que os alimentos tenham.
Estou absolutamente convencida (porque é um facto) de que a comida é um vício tão forte quanto qualquer outro vício como drogas ou álcool. A partir do momento em que começamos a abusar não conseguimos largar por mais vontade que tenhamos.
Temos que ser radicais. Pôr um ponto final e dizer "não! eu não vou comer este delicioso bolo de bolacha que está aqui à minha espera e que vai ficar estragado se eu não lhe der caminho". E até parece uma coisa muito simples de fazer mas logo a seguir vem a Filipa número dois da minha consciência (ou o diabinho no ombro como gosto de chamar) dizer "nada disso, vamos comer e saborear este pequeno pedacinho de céu porque é tudo o que precisamos na nossa vida para sermos felizes" e o que é que acham que eu faço? Como o bolo de bolacha!
Todos os dias acordo convencida que naquele dia não vou comer nada que me faça mal. Tenho um pacote de flocos de aveia no armário e outro de leite de arroz no frigorífico. É só juntar e pôr no microondas. Eu até gosto daquilo, então porque raio é que na altura de comer me desvio para os pacotes de bolacha?
Cada vez mais pareço o monstro das bolachas. Doida por biscoitos, gorda como tudo e olhem só hoje até estou a usar uma camisola azul!
Preciso de regras alimentares na minha vida. Regras alimentares que eu siga e que respeite. Preciso de meter na cabeça que se não emagreço não vou a lado nenhum na minha vida. As dores vão piorar, vou sentir-me cada vez mais horrorosa e vou conseguir fazer menos coisas porque o peso dificulta imenso a quantidade de actividade física que eu consigo fazer e eu não quero nada disto. Tenho 25 anos bolas! Ainda vejo desenhos animados com uma tacinha de cereais na mão, preciso de resolver a situação antes de me ver velha, desgastada e sem motivação.
Amanhã é segunda-feira. Pode ser que exista um milagre qualquer na minha vida que me faça ganhar juízo. Se não fizer.... esperem encontrar-me a chorar compulsivamente porque não posso comer o frasco de nutella inteiro.
Está quase a fazer uma semana desde que entrei nos vinte e cinco anos. Um quarto de século como tenho dito a toda a gente; portanto só posso concluir que estou a ficar velha!
A partir de agora estima-se que será sempre a descer portanto não posso criar muitas expectativas. Isso é uma coisa que tenho vindo a tentar não fazer de todo: criar expectativas, porque aquilo que eu não espero que aconteça não me vai magoar se efectivamente der para o torto. A verdade é que não é fácil ser uma pessoa calma e livre de ter macaquinhos na cabeça em relação a literalmente qualquer coisa que me apareça à frente.
Vou comer pizza? Vou ficar o tempo todo a imaginar o sabor da melhor pizza do mundo até comer e se calhar não me saber tão bem. Vou começar uma dieta? Epá, vai correr tão bem que vou ficar uma modelo em tempo recorde! Gosto de uma pessoa? Quando dou por mim só não me imagino a casar com ela porque não consigo imaginá-lo com ninguém mas vocês percebem a ideia certo?
Esta coisa de tentar não criar expectativas tem-me dado uns pontapés por baixo da mesa na medida em que eu para não ter as boas expectativas no céu começo a deecê-las tanto que vou parar à subcave.
Quando penso que completei metade da metade de um século que todos sabemos que são cem anos, vejo-me completamente perdida e ansiosa em relação a tudo o que eu não fiz.
Recrimino-me por nunca ter sido uma pessoa normal e por não ter seguido os caminhos normais que as pessoas da minha idade seguiram. Não fui para a faculdade, nunca fui sair à noite a uma discoteca, não realizei um sonho de vida, não senti que fazia parte de um grupo de amigos fixo e unido, não conquistei o corpo que desejava, não escrevi o livro que eu queria, não namorei de forma normal, não pratiquei exercício como devia, não encontrei a carreira certa para mim, não me integrem nos empregos que arranjei. Nunca senti que fazia falta.
São coisas que uma pessoa pára para pensar é inevitável que se sinta em baixo. Tenho feito um grande esforço para mudar e para deixar estas ideias deprimentes de parte mas não é de todo fácil fugir à minha natureza.
Ultimamente tenho pensado muito no facto do Harrison Ford só ter começado a sua carreira de actor aos 40 anos e tento agarrar-me à pouca esperança que sai desse pensamento. Se calhar ainda não é o meu momento e quando for até vou sentir fogo de artifício no meu coração mas e se esse tempo não chegar?
Tenho medo de não corresponder às expectativas que os outros têm em mim e de dar por mim com meio século sem ter feito nada do que devia. Gostava de pensar que as coisas vão ser bem mais fáceis mas tenho os meus óculos da negatividade colocados e não consigo tirá-los por enquanto.
Nos últimos meses acho que fiz jus ao "ano novo, vida nova" que não prometi a mim própria este ano. Não prometi porque honestamente não tinha a mínima esperança de que a minha vida fosse mudar ou melhorar ou qualquer coisa do género. Na verdade esperava exactamente o contrário e nesse caso o cenário era bastante mais trágico.
Mas aqui estou eu, quase oito meses depois do início de 2019 e embora não esteja completamente mudada nem tenha ultrapassado todos os meus problemas, já posso dizer que estou diferente.
A maioria das diferenças não se vê e continuo a cair todos os dias em erros que tenho noção que devo mudar mas ao mesmo tempo eu já consigo identificá-los e saber porque é que não os devo cometer. Como já disse várias vezes isto não é fácil mas é um processo demorado e as coisas têm que ser bem feitas para não voltarem a acontecer desgraças.
Gostava de vos contar algo inspirador, a sério que gostava, só que não há milagres nem feitiços encantados que me façam ficar bem do dia para a noite.
Não vos consigo dizer o quanto quero ficar bem. O quanto quero ser uma adulta responsável e com um trabalho que me faça progredir, interesses que me inspirem e me façam continuar a viver e a levantar-me sempre que algo me mandar abaixo. Sinto que há quem não acredite em mim e que não consiga ver todos os esforços que tenho feito (e têm sido enormes) para melhorar. Gostava imenso de poder mostrar que não desisti, nem vou desistir e que o meu coração ainda acredita que daqui a uns tempos vou agradecer ter ultrapassado toda esta tempestade.
Por enquanto só me resta ir dando passinhos de bebé até um dia olhar para trás e perceber que esses passinhos se tornaram gigantes e que eu passei a ser um ser com uma mente e uma força gigante.
Cresci como uma criança tímida que detestava fazer avaliação de educação física à frente da turma com medo de falhar. Nunca tive facilidade em fazer amigos e a melhor altura do meu dia é quando estou sozinha e não preciso de falar ou ouvir ninguém. Resumindo, sou uma pessoa introvertida.
É claro que isso não é um enorme problema nem tem qualquer relação com a fibromialgia assim à primeira vista. Existem milhões de pessoas neste mundo que sentem as mesmas dificuldades em socializar e continuam a viver a vida delas felizes e contentes tentando alcançar os seus objectivos e a realizar os seus sonhos. Não é um problema, são apenas personalidades.
Mas as coisas mudam quando para além de introvertidos nos aparece uma pergunta na cabeça que chega tão rápido e doloroso como uma chapada na cara. O que é que eu estou a fazer aqui? Qual é o meu lugar aqui?
Por norma quando nós nascemos temos ali uns aninhos agradáveis em que não fazemos absolutamente nada da vida para além de comer, dormir e brincar. Somos felizes sem razão, apenas porque sim. Não questionamos o sentido da vida, não pensamos no trabalho que vamos ter no futuro ou nas responsabilidades que nos esperam. Somos inocentes e puros.
Depois chega ali por volta da altura do sétimo ou oitavo ano em que finalmente nos começamos a aperceber que os adultos esperam que nós - miúdos de treze e catorze anos - tenham alguma ideia do que "querem ser quando forem grandes" de uma forma mais realista. Passamos o nono ano a estudar para uns exames que todos (sem excepção) odiamos ter que fazer e quando, no fim disso tudo, tratamos dos papéis e matrículas para o décimo ano confrontam-nos com uma questão importante: o que é que vamos fazer a seguir?
Vamos para o ensino regular ou vamos tentar o profissional? Queremos línguas e humanidades, economia ou ciências? Queremos ser médicos, políticos, atletas, biólogos? Queremos o quê?
É aí que a coisa complica porque sejamos sinceros: quase nenhum miúdo nos seus quinze anos sabe o que quer da vida. Aquilo que sabemos é que para nós o ideal era sermos algo como estrelas de cinema, verdadeiros rockstars ou artistas que vão mudar o mundo. Queremos voar. Queremos ser reconhecidos, ser alguém.
Lá acabamos por escolher aquilo que achamos mais realista ou então somos corajosos e seguimos o nosso coração na esperança que façamos da nossa paixão um trabalho no futuro.
O que importa é que a primeira vez que fazemos a primeira escolha importante do resto das nossas vidas somos uns adolescentes imaturos e completamente perdidos.
Mas tudo bem, vamos à luta. É altura do secundário - literalmente a pior altura da minha vida - e começamos a estudar coisas que se calhar não nos interessam mesmo para nada e pensamos num momento ou outro se escolhemos bem. Enfim, já está, já está, vamos lá acabar o secundário e despachar a coisa.
Acaba a escola. Dezoito anos e está na altura de realmente nos atirarmos aos lobos. Para os mais sortudos é altura da faculdade e da vida louca (ou não) e para outros é hora de nos fazermos de crescidos e começar a trabalhar. Sem curso e experiência vemo-nos obrigados a aceitar trabalhos que não nos interessam para nada, que nos exploram e nos pagam tão mal que quase choramos ao ver o ordenado no final do mês.
Mas não há problema, nós conseguimos. Isto é só para ganhar experiência e em breve vamos conseguir crescer numa empresa e encontrar algo que gostamos de fazer ou então vamos só juntar uns trocos para tirar a nossa licenciatura. Parece simples, não há nada que possa falhar num plano em que é só 1: trabalhar ou estudar, 2: colher os louros. Só que não.
A vida complica-se. A universidade é mais difícil do que parecia, o trabalho leva-nos ao limite de nos tornarmos psicopatas e temos que lidar com tudo com a maior maturidade possível porque já não somos crianças e isso é esperado de nós. As coisas começam a correr mal. Não conseguimos estudar ou ter realmente boas notas. Não conseguimos aturar mais tretas de clientes que descarregam os problemas todos da vida deles em nós. Não conseguimos lidar com a enorme desilusão de estarmos a ser esmagados pela sociedade e pela realidade.
O que é que acontece quando percebemos que nada disto é o que queremos?
Eu perdi o meu lugar. Na verdade nunca sei se alguma vez o tive ou soube onde realmente pertencia. Quando andava no oitavo ano achava que tinha a minha vida decidida e estruturada mas estava enganada porque a vida seguiu um rumo que eu não esperava e não queria. E quando de repente vi o tempo estava a passar e os meus sonhos pareciam cada vez mais longe percebi que o mundo real era bem mais frio e duro do que eu achava. Afinal só estamos aqui para ser mais um número. Para viver, trabalhar até o estado querer, descontar dinheiro que nunca vamos rever, ter direito a uma reforma miserável e morrer doentes, infelizes e acima de tudo sem nunca termos realizado o que queríamos.
Este pensamento magoou-me e assombrou-me durante tanto tempo que ainda hoje, que o tento contrariar ao máximo, me faz duvidar se a vida vale verdadeiramente a pena. Por isso senti-me perdida. Sinto-me perdida.
O pior pesadelo de um ser humano é ser confrontado com uma realidade que implica viver na mediocridade e, talvez, uma infelicidade constante? Vá, até posso estar a ser dramática mas eu não quero de todo entregar-me àquilo a que todos se entregam: trabalhar para pagar as contas no final do mês e nada mais.
Se estamos todos aqui para isto qual é o verdadeiro sentido de viver? Porque é que passamos uns 60 anos da nossa vida a criar dinheiro para outras pessoas usarem e abusarem quando nós não temos tempo nem sequer para explorar coisas novas, encontrar interesses que nos façam crescer como seres humanos. Porque é que vivemos durante tempo para morrermos insatisfeitos?
Esta é a dúvida que me percebe há muitos anos e que me faz ter vontade de desistir e nem sequer tentar ser mais uma prisioneira de uma sociedade que não foi feita para pessoas como eu. Não me acho especial, nem nada. Acho apenas que a vida não é para toda gente. Tal como nem todos nasceram para ser guitarristas, por exemplo.
Mas não se assustem. Ultimamente tenho tentado combater este meu conflito interior ao resolver os meus problemas pessoais e acima de tudo descobrir quem eu sou. Eu nunca soube quem era. Sempre soube quem eu não era e o que eu não queria. Sempre conheci a dor, a desilusão e a solidão e no meio disto tudo nunca consegui quebrar o ciclo e ver para lá do mal, ver quem eu realmente sou e o que represento.
Nunca consegui até agora.
O caminho tem sido difícil. Nem vos consigo explicar como tem sido complicado mudar completamente a minha mentalidade e começar a acreditar em coisas novas e, no fundo, a ter esperança de que há uma razão maior para eu estar aqui. Ainda não sei qual é mas tenho a certeza de que é importante continuar a lutar contra a depressão e contra a fibromialgia para me descobrir porque eu sei que sou mais do que distúrbios ou doenças. Eu sou mais que isso. Eu tenho qualidades e tenho potencial para ser mais. Para ser especial.
Ainda tenho muito medo de tantas coisas. Tenho medo da rejeição, da desilusão. Tenho medo de não ser boa o suficiente e de ser uma pessoa dispensável para os outros. Tenho medo de não conseguir sair do posso e de estar a esforçar-me para chegar um dia e perceber que nada vale a pena. Tenho medo que o corpo me falhe. Tenho medo que a cabeça não dê para mais. Tenho medo de não ter a inteligência ou as capacidades necessárias. Tenho medo de me resignar a ser infeliz num trabalho que não gosto. Tenho medo de voltar ao que era antes.
Mas mesmo com todo esse medo eu não deixo de seguir em frente. Estou a continuar e a esforçar-me como nunca me esforcei antes para navegar por mares desconhecidos e ver para lá do meu medo. De que me vale estar aqui se não vou tentar explorar e se vou ficar sempre presa a uma ilha de revolta e infelicidade? Eu vou navegar e vou descobrir. Talvez não seja uma descoberta tão importante como o caminho marítimo para a Índia mas vai ser mais significativa para mim e vai-me permitir alcançar muito mais.
Ainda não sei o que é ou onde é. Ainda não sei quem sou nem do que sou capaz.
Sabem aquilo que nos faz funcionar todos os dias e nos distingue completamente de todos os animais existentes no planeta? Ora aí está: emoções.
O que torna este tema interessante para mim é o facto de não só me lixar porque tenho que lidar com elas para ter a vida minimamente estável como, assim que me deparo numa daquelas situações complicadas em que só me apetece explodir, as dores pioram.
Vamos fazer uma pausa para toda a gente fingir que está surpreendida. A fibromialgia tem a ver com as emoções? Que informação dramática.
Mas agora a sério, o maior problema da minha vida é sem qualquer dúvida esse. Ter que resolver problemas e não "panicar" logo de início, ficar frustrada e não bater em toda a gente, receber uma boa notícia e não sentir o êxtase que parece que andei nas drogas.... Isso tudo é importante para uma vida saudável mental e física.
Acontece que aqui a vossa amiga sabe isto tudo na teoria e depois quando chega a altura de pôr em prática... nada. Espalho-me ao comprido como se fosse um veado acabado de nascer. Ou como naquela vez que caí de cu na lama.... ou de cu em Madrid... ou de cu pelas escadas abaixo... Ora aí está uma acção representativa da minha vida.
Como eu estava a dizer eu não consigo ainda lidar com as emoções como se fosse uma adulta responsável. Sei colocar os papéis do IRS, mas resolver os meus conflitos interiores nem por isso. Que ironia.
Só que eu não sou a única e por isso é que estamos aqui. A verdade é que a grande maioria dos problemas da nossa vida (se é que não são todos) provém exactamente da nossa incapacidade de sentir uma coisa e descortiná-la da forma mais simples possível. Mas não, nós como somos pessoas super inteligentes pegamos nessa dita coisa, damos-lhe cinquenta voltas para ficar emaranhada como um novelo, damos-lhe uns suplementos alimentares para ela crescer e ensinamo-la a ser teimosa e quando damos por nós onde é que aquilo já vai. E como ela, fazemos o mesmo a tantas outras que sentimos.
Se vos disser que a minha médica hoje me disse que eu tenho feito um enorme trabalho no hospital a tratar de mim própria provavelmente não acreditariam. E é tudo muito bonito: eu chego lá, falo dos meus problemas, começo a ver soluções, começo a fazer planos de vida e quero é andar para a frente. Parece espectacular até ao momento em que acordo um dia e me sinto na verdadeira merda.
O que é que aconteceu? Porque é que eu estava tão bem e agora sinto que nada nesta vida faz sentido? Se vos conseguisse responder a isto claramente não estava lá no hospital. Já tinha tido alta e um certificado de honra de psiquiatria. Só que não.
As emoções fazem de nós quem somos. Não esperem, não é isto que eu quero dizer. As emoções fazem-nos mostrar quem as outras pessoas acham que somos no nosso dia-a-dia porque se não as conseguirmos controlar vamos obviamente parecer alguém que nem sequer reconhecemos no espelho. Elas fazem-me ser agressiva e implicativa, fazem-me criticar tudo e todos à minha volta, fazem-me não aceitar ser contrariada, fazem-me chorar demasiado e estar a rir feliz no momento a seguir. Às vezes não entendo como é que as pessoas ainda não me colocaram oficialmente o autocolante na testa a dizer "maluca" mas deve estar quase.
Também me fazem ser má para as pessoas que gosto e descarregar a minha revolta acumulada em quem não merece. E isso faz ricochete e acerta-me como um soco no estômago quando percebo que estou a errar e não me consigo controlar. Eu consigo, só que ainda não sei como.
Neste frenesim de sentimentos e acções tresloucadas o meu corpo decide-se juntar à festa e começa uma dor ali, outra dor aqui até que quando dou por mim já não me mexo. É profundamente ridículo e enervante porque eu não quero aceitar que isto seja só uma coisa da minha cabeça e que a culpa é minha mas cada vez que me enervo sinto dores como se me estivesse a castigar a mim própria por efectivamente ser humana.
Isto não é bom como é óbvio porque como devem calcular eu passo o dia numa montanha russa de sentimentos, emoções, estados de espírito e tudo o que signifique que não estou boa da cabeça. Quando chego ao fim do dia estou tão cansada que nem consigo ouvir a minha própria voz da consciência a pensar em qualquer coisa. Pior ainda é que quando durmo não consigo descansar e no dia a seguir recomeça esta aventura toda.
Por isso, na teoria a questão é muito simples: é preciso saber lidar com as emoções. Até aí tudo bem.
Ontem fez quatro meses que decidi mudar a minha vida e entrar para um tratamento psiquiátrico intensivo. Parece assustador não é? "Tratamento psiquiátrico intensivo", "hospital de dia", "internamento parcial".
Mas sabem o que aprendi nestes noventa e cinco dias?
Nem sei por onde vos começar a contar.
Em primeiro lugar, temos que começar a descomplicar e a perder o medo da expressão "saúde mental". Aliás, não é desse conceito, deixem-me reformular: temos que perder o medo de falar de depressão, ansiedade, suicídio, distúrbios mentais, perturbações psicológicas e esses nomes todos estranhos que as pessoas normalmente fogem. Elas existem e uma enorme parte da população mundial sofre delas. Sem vocês saberem, podem estar no dia a dia a falarem com dezenas de pessoas que sofrem de perturbações mentais em completo silêncio.
Vamos aos números: mais de 12% das doenças que existem no mundo inteiro são de foro psiquiátrico e, dessa percentagem, 4,4% pertence a pessoas que sofrem de depressão. Directamente falando, isto significa que mais de 300 milhões de pessoas no mundo lidam com depressão todos os dias. Se quiserem algo mais chocante a principal causa de mais de 800 mil mortes todos os anos do mundo é a depressão.
A única coisa que vos deve preocupar ainda mais que isto é saber que dentro deste gigante aglomerado de 300 milhões de pessoas, um quarto recebe tratamento e apenas 10% deles é que tem um tratamento adequado. Se não vos apetece fazer contas, deixem-me ajudar: de 300 milhões de pessoas a sofrer, 75 milhões recebe tratamento e 7,5 milhões é que se sente realmente ajudada.
Em Portugal 22,9% das pessoas sofrem de uma perturbação psiquiátrica, isto é um quinto da população nacional e é muito mais do que vos possa parecer. Nós somos 10 milhões de habitantes neste país e 2 milhões e 290 mil pessoas estão a sofrer todos os dias com uma perturbação mental. Uma em cada cinco pessoas sofre. Estão a ver a gravidade?
E em vez de falarmos, de alertarmos, de educarmos e tratarmos tentamos censurar a palavra e fingir que nada acontece. Criamos adultos perturbados e disfuncionais que por sua vez vão ter filhos que vão crescer numa situação familiar que não é de todo adequada. Em vez de enfrentarmos o demónio de frente, estamos a reprimi-lo porque ele é um tabu.
No meio disto descobri uma experiência que me veio abrir tanto os olhos.
Ao início pensei que fosse para ter seguimento normal com umas quantas consultas de dois em dois meses ou algo do género. Até que me vi numa sala com psiquiatras, psicólogas e enfermeiras a olhar para mim, todos muito sérios. Estava numa entrevista. Só que não era de emprego, era pior.
Quando me disseram as palavras "hospital de dia" tive vontade de gritar. Primeiro porque sempre associei hospitais de dia a centros onde os velhinhos vão quando não têm nada para fazer e depois porque hospital psiquiátrico não é de todo apelativo ao ouvido.
A minha primeira reacção foi um forte "não" com letras maiúsculas e a negrito e com um ponto de exclamação enorme a pairar por cima da minha cabeça. Como isso não era visível vim para casa com uns dias para pensar se aceitaria entrar no programa ou não. Com um diabinho num ombro e um anjinho no outro lá me decidi que iria atirar-me de cabeça porque era tudo muito melhor do que esperar sentada por uma consulta de psiquiatria que nunca mais vinha. Lembram-se da história?
O tempo passou e a cada semana senti que me ia descobrindo um bocadinho mais. E tenho direito a tantas coisas que não vos passa pela cabeça. Tudo sem pagar porque é num hospital público. Para além do mais, de quinze em quinze dias tenho lá a minha família não só para verem como me vou dando mas também para resolver qualquer tipo de problema que eu sinta necessário tratar.
O que eu quero dizer com isto é que eu sei que este hospital de dia é um dos poucos que existem em Portugal e é sem dúvida o melhor que existe porque eu já ouvi várias pessoas e vários profissionais a dizê-lo.
Sei que no norte do país nem sequer existem estes programas e como aí também noutros lados menos povoados as pessoas vêem-se completamente sozinhas no que toca a ajuda e acompanhamento. O que me deixa triste é saber que para muitas dessas pessoas a vida chega ao fim.
Eu não sou a única a ter pensamentos maus. Não sou a única a cometer erros na vida e a querer desistir de tudo e para além de ter encontrado pessoas com as quais me identifico estou a encontrar-me a mim própria e isso é o mais importante de tudo. Descobri problemas na minha vida que eu nem sabia que existiam e que estavam a limitar-me de uma forma tão intensa que eu nunca imaginaria como solucioná-los.
Ainda não sei mas estou a caminhar para lá.
Não se iludam. Os pensamentos continuam cá. A dor e a tristeza profunda ainda não me abandonaram mas eu já consigo ver uma pequena luz ao fundo do túnel que tem um potencial enorme para crescer. Eu também tenho potencial para crescer, para me tornar numa pessoa melhor, uma pessoa mais forte.
Gostava que mais pessoas tivessem a oportunidade de fazer o caminho que eu estou a fazer agora e espero que no futuro exista uma luta maior pela saúde mental. Até lá vou tentar pôr-me boa para me juntar a essa batalha.
Mas de uma coisa podem ter a certeza, eu vou lutar. Seja por mim, seja por todas as outras pessoas que sofrem, eu vou estar lá na linha da frente a dar o corpo às balas se for preciso porque vou estar mais forte para proteger e dar a mão a quem está frágil e não consegue ter forças para lutar.
Sempre na esperança de que um dia Portugal seja um país com mais saúde e quem sabe mais felicidade.
Se há coisa neste mundo que me assusta mais do que palhaços são as palavras "junta médica". É só falarem-me disso que os cabelos na minha nuca se eriçam todos e o meu estômago começa às voltas.
Imaginem a minha cara quando há cerca de duas semanas descobri que hoje à tarde me esperava a tão famosa dita consulta da junta médica onde um bando de médicos que nunca me viu na vida iria decidir se eu continuava suficientemente doente para estar de baixa ou se estava óptima, fantástica, maravilhosa e pronta para voltar ao activo.
Não me interpretem mal. Eu quero voltar a trabalhar. Quero construir uma vida e uma carreira que me possa tornar uma verdadeira adulta. Ser alguém. Viver e não existir só.
Mas eu ainda não estou bem. Ainda há muita coisa trancada dentro da minha cabeça que tem que ser arrancada cá para fora, analisada e resolvida. Estou no início desta pequena aventura mas já descobri que existe muito para remexer. Estou a tentar, disso tenho a certeza.
Acontece que a junta médica não é propriamente conhecida por ter as pessoas mais simpáticas do mundo a trabalhar lá. Normalmente, entra-se na sala e deparamo-nos com médicos mal encarados que nos querem mandar trabalhar estejamos a morrer ou não. Por isso, não é uma surpresa quando ouvimos pessoas verdadeiramente doentes saírem de lá irritadas, deprimidas, frustradas e revoltadas porque num espaço tempo de minuto e meio alguém que nunca os conhecera anteriormente decidiu que estavam óptimos para trabalhar, só porque sim.
Eu sei que é tudo por causa de uma minoria (ou não) de pessoas que acham que podem enganar a segurança social e viver à custa de uma entidade que todos pagamos apenas porque não lhes apetece trabalhar. Mas temos que pensar nos outros: aqueles que estão mal e que precisam de ajuda. E, acima de tudo, que precisam de tempo para ter essa ajuda.
Só que hoje.... hoje foi diferente! A ansiedade estava lá, a dar cabo de mim tal como se eu tivesse acabado de comer um iogurte estragado. Continuava mal disposta, nervosa, pronta para desistir de respirar e atirar-me para o chão. Estive assim até ser chamada e entrar no consultório onde duas senhoras simpáticas estavam à minha espera. Acreditam nisto?! Simpáticas!
Nem dois minutos estive lá dentro. Fizeram-me uma ou duas perguntas básicas, leram os meus relatórios e mandaram-me embora com um papelinho que me dava autorização para continuar de baixa e consequentemente continuar o meu tratamento diário.
Porque acreditem ou não, é importante que continue a fazer o que tenho estado a fazer nestes últimos dois meses para que um dia possa finalmente dizer que estou bem. Vai demorar, eu sei bem que vai demorar, mas o importante é não desistir.
E sei que isto de sermos apenas números e de termos pessoas desconhecidas a decidirem o nosso futuro com míseros minutos de "conversa" e sem olharem para nós como realmente somos, como realmente sofremos. Mas esse é um tema para outro dia.
Não foi nada fácil, devo dizer. Mais de dez crianças entre os dez e os onze anos enfiados numa sala a pular de um lado para o outro, a gritar, a cantar, a dançar, a rir, a falar.... ENFIM. Acho que percebem a ideia.
Quando me lembro de trabalhar num sítio em que parte da minha função era entreter miúdos com jogos divertidos, vem-me à ideia que nessa altura era muito mais fácil chamar-lhes a atenção. Mas eu não sou uma desistente e tal como antigamente peguei nuns jogos interessantes e nada infantis para eles se divertirem.
E podem crer que se divertirem. Divertiam-se tanto que às vezes eu tentava falar e não conseguia ser ouvida nem por mim própria! Já sei aquilo que os professores sentem na escola e com isto deixo um enorme pedido de desculpas a todos os professores que já tiveram de me aturar.
De qualquer das formas sinto que foi uma missão cumprida. Os meus pais arrasaram na decoração: puseram as minhas ideias em prática, juntaram-lhe magia e ficou tudo espectacular. A família toda conseguiu encher a minha irmã de alegria com as prendas que ela nunca esperaria. Os doces eram bons - eu não posso falar por mim porque passei o fim-de-semana inteiro a torradas. Chorem por mim.
Os presentes nos saquinhos estavam originais com um marcador de livros feito por mim, impresso pelo meu tio e plastificado pela minha tia - chama-se a isto teamwork malta.
Enfim, em suma acho que a minha irmã adorou o dia de festa em que se divertiu imenso com os amigos, recebeu prendas giras, riu, dançou, jogou, comeu doces e teve as atenções todas nela.
E eu como irmã babada como é óbvio também adorei. Mas aqui entre nós deixem-me dizer-vos que o que adorei mesmo foi chegar à cama no fim do dia e adormecer que nem uma pedra.
Por isso já sabem, se tiverem alguma fase de insónias a solução é uma festa de pré-adolescentes. Funciona melhor que comprimidos!
Acontece que há exactamente onze anos atrás eu não fazia a mínima ideia que a alegria da minha vida estava na barriga da minha mãe à espera de nascer. Foi a dia 22, às 17h31 que o meu mundo mudou.
Passei de "não quero, recuso-me, detesto a ideia de ter uma irmã" a "que bebé mais linda e fofinha, quero protegê-la para sempre". Não fiquem chateados, estava naquela idade difícil dos 14 anos em que tudo no mundo é horrível. Não é que agora tudo no mundo seja bonito, mas graças a deus já não estou na idade parva!
Como eu estava a dizer, ela nasceu e veio transformar a minha vida para sempre. Não há criança no mundo que para mim seja mais linda, mais divertida, mais fofinha e mais capaz de vencer qualquer coisa que meta na cabeça. A minha irmã vai ser uma super-heroína. Só ainda não é porque a licença de super-herói só pode ser tirada aos 18 anos. Paciência minha gente.
Com toda esta excitação (leia-se profunda nostalgia) do tempo ter passado tão rápido e da minha bebé pequenina já ser uma pré-adolescente, não há nada mais indicado para festejar o dia como uma grande festa!.... no dia seguinte.
As festas de crianças ainda têm que esperar para fins-de-semana, sim.
Então estamos todos numa missão difícil mas não impossível de criar a melhor festa de sempre - sem ser como aqueles pais americanos ridículos que parecem criar dinheiro do nada com orçamentos estupidamente alargados que nem sabemos como - para a nossa menina passar um dia maravilhoso.
Decoração, convidados, doces (muito importante!) e tantas outras coisas que já nem me consigo lembrar do cansaço acumulado de andar à procura de coisas bonitas para a festa. O continente falhou-me completamente e se o nosso amor ainda não tinha acabado hoje tenho a dizer que encontrei um novo amor: o chinês.
Não há melhor sítio para usar a imaginação, deixem-me dizer-vos.
Mas é isto, eu e a minha família andamos todos numa demanda profunda para planear uma festa de uma pré-adolescente por isso agora têm que me aturar assim.
Veremo-nos então depois do sábado... se eu sobreviver!
É oficial: juntei-me ao grupo de pessoas com um bullet journal.
Sabem toda aquela história de eu ter sempre a cabeça desorganizada e não me conseguir lembrar de certas coisas ou da necessidade que tenho de ser criativa quando nunca consigo? Bom, descobri a solução.
Há muitos anos que mantenho um pequeno caderno preto como uma espécie de diário em que escrevo os meus pensamentos mais íntimos e de vez em quando lá desenho qualquer coisa engraçada. Antes disso, é importante contar-vos que passei a minha vida a coleccionar caderninhos onde escrevia imensas histórias, textos e coisinhas sem graça nenhuma que me passavam pela cabeça. Quando eu era adolescente garanto-vos que não me encontravam em lado nenhum sem um caderno.
Ora, gostando eu tanto de escrever e de cadernos... .e material de papelaria no geral (eu sei, é um vício muito sério!) nunca resisti na altura de pôr mãos à obra e de me sentir uma menina pequena no seu primeiro dia de escola. É aqui que se coloca o problema. Cada caderno era para uma coisa diferente, não podia misturar certas coisas em cadernos mais elegantes porque só podiam ser para aquilo e ficarem bonitos e o pior: a quantidade de cadernos em branco que tenho guardados em casa pelo simples facto de não os querer estragar com a minha letra feia e clara falta de jeito para desenhar.
Mas enfim, há uns meses atrás lá comecei a encontrar na internet páginas lindíssimas de algo que parecia uma agenda só que não era bem uma agenda. Era algo mais. Era especial!
Então fiquei obcecada com este dito bullet journal e andei meses e meses à procura de um caderno pontilhado que não custasse os olhos da cara para poder começar. Queria ser produtiva, queria ser criativa, queria ser especial.
Na altura não encontrei e fiquei muito chateada por ter apenas mínimas opções que eram demasiado e desnecessariamente caras e então continuei com o meu caderno preto a explorar a minha criatividade. Nunca fui pessoa de escrever todos os dias religiosamente no diário porque dou por mim muitas vezes cansada e sem paciência. Já devem ter reparado pelo meu blog.
De qualquer das formas era importante ter algo que me permitisse organizar os pensamentos e experimentar rastrear coisas que seriam importantes para o meu bem estar como as minhas horas de sono e o humor ao longo do dia. Para além disso, e chamem-me picuinhas à vontade, queria uma coisa que ficasse verdadeiramente agradável à vista. Então imaginem só a minha cara quando no Natal estou a abrir os presentes e recebo o quê? Exacto, um caderno pontilhado!
Acreditem que quase dancei.
Mas não menosprezem a minha enorme capacidade de procrastinar por não acreditar nas minhas capacidades ou o tal medo de deixar tudo feio. Demorou um mês e alguns dias para que eu conseguisse pegar no caderno e o transformasse no meu bullet journal.
Ganhei finalmente coragem quando um dia no hospital, uma das psicólogas mencionou que podíamos começar a fazer um mood tracker ou se quiséssemos um bullet journal. Eu já tinha planeado naquele fim de semana começar mas ainda não tinha tido o empurrãozinho. Quando cheguei a casa comecei.
Estraguei logo a primeira página! Ia a escrever "bullet journal" na primeira página pontilhada para fazer uma capa bonita e comecei a fazer as letras demasiado grandes. Fiquei logo assustada mas como sou uma tipa que às vezes até tem umas ideias fixes: transformei o "bull" em "BOO!", desenhei um fantasma e essa foi a minha primeira página.
Desde então nada tem corrido como eu idealizo quando vou fazer uma página mas decidi não me preocupar e dar asas à imaginação. Uso cores diferentes, tipos de letra diferentes e muitas ideias que encontro na internet. Assim vou-me organizando, vou sendo criativa e acima de tudo vou transformando o que sinto em algo saudável e produtivo.
Finalmente encontrei uma forma gira de organizar os pensamentos.
Agora falta organizar o resto mas isso fica para a próxima!