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Cronicamente Fabulosa

Tenho fibromialgia, mas também sou fabulosa e esta é a grande aventura que é a minha vida.

Cronicamente Fabulosa

Tenho fibromialgia, mas também sou fabulosa e esta é a grande aventura que é a minha vida.

Emoções.

por AF, em 23.04.19

Sabem aquilo que nos faz funcionar todos os dias e nos distingue completamente de todos os animais existentes no planeta? Ora aí está: emoções.

O que torna este tema interessante para mim é o facto de não só me lixar porque tenho que lidar com elas para ter a vida minimamente estável como, assim que me deparo numa daquelas situações complicadas em que só me apetece explodir, as dores pioram.

Vamos fazer uma pausa para toda a gente fingir que está surpreendida. A fibromialgia tem a ver com as emoções? Que informação dramática.

Mas agora a sério, o maior problema da minha vida é sem qualquer dúvida esse. Ter que resolver problemas e não "panicar" logo de início, ficar frustrada e não bater em toda a gente, receber uma boa notícia e não sentir o êxtase que parece que andei nas drogas.... Isso tudo é importante para uma vida saudável mental e física.

Acontece que aqui a vossa amiga sabe isto tudo na teoria e depois quando chega a altura de pôr em prática... nada. Espalho-me ao comprido como se fosse um veado acabado de nascer. Ou como naquela vez que caí de cu na lama.... ou de cu em Madrid... ou de cu pelas escadas abaixo... Ora aí está uma acção representativa da minha vida.

Como eu estava a dizer eu não consigo ainda lidar com as emoções como se fosse uma adulta responsável. Sei colocar os papéis do IRS, mas resolver os meus conflitos interiores nem por isso. Que ironia.

Só que eu não sou a única e por isso é que estamos aqui. A verdade é que a grande maioria dos problemas da nossa vida (se é que não são todos) provém exactamente da nossa incapacidade de sentir uma coisa e descortiná-la da forma mais simples possível. Mas não, nós como somos pessoas super inteligentes pegamos nessa dita coisa, damos-lhe cinquenta voltas para ficar emaranhada como um novelo, damos-lhe uns suplementos alimentares para ela crescer e ensinamo-la a ser teimosa e quando damos por nós onde é que aquilo já vai. E como ela, fazemos o mesmo a tantas outras que sentimos.

Se vos disser que a minha médica hoje me disse que eu tenho feito um enorme trabalho no hospital a tratar de mim própria provavelmente não acreditariam. E é tudo muito bonito: eu chego lá, falo dos meus problemas, começo a ver soluções, começo a fazer planos de vida e quero é andar para a frente. Parece espectacular até ao momento em que acordo um dia e me sinto na verdadeira merda.

O que é que aconteceu? Porque é que eu estava tão bem e agora sinto que nada nesta vida faz sentido? Se vos conseguisse responder a isto claramente não estava lá no hospital. Já tinha tido alta e um certificado de honra de psiquiatria. Só que não.

As emoções fazem de nós quem somos. Não esperem, não é isto que eu quero dizer. As emoções fazem-nos mostrar quem as outras pessoas acham que somos no nosso dia-a-dia porque se não as conseguirmos controlar vamos obviamente parecer alguém que nem sequer reconhecemos no espelho. Elas fazem-me ser agressiva e implicativa, fazem-me criticar tudo e todos à minha volta, fazem-me não aceitar ser contrariada, fazem-me chorar demasiado e estar a rir feliz no momento a seguir. Às vezes não entendo como é que as pessoas ainda não me colocaram oficialmente o autocolante na testa a dizer "maluca" mas deve estar quase.

Também me fazem ser má para as pessoas que gosto e descarregar a minha revolta acumulada em quem não merece. E isso faz ricochete e acerta-me como um soco no estômago quando percebo que estou a errar e não me consigo controlar. Eu consigo, só que ainda não sei como.

Neste frenesim de sentimentos e acções tresloucadas o meu corpo decide-se juntar à festa e começa uma dor ali, outra dor aqui até que quando dou por mim já não me mexo. É profundamente ridículo e enervante porque eu não quero aceitar que isto seja só uma coisa da minha cabeça e que a culpa é minha mas cada vez que me enervo sinto dores como se me estivesse a castigar a mim própria por efectivamente ser humana.

Isto não é bom como é óbvio porque como devem calcular eu passo o dia numa montanha russa de sentimentos, emoções, estados de espírito e tudo o que signifique que não estou boa da cabeça. Quando chego ao fim do dia estou tão cansada que nem consigo ouvir a minha própria voz da consciência a pensar em qualquer coisa. Pior ainda é que quando durmo não consigo descansar e no dia a seguir recomeça esta aventura toda.

Por isso, na teoria a questão é muito simples: é preciso saber lidar com as emoções. Até aí tudo bem.

O resto? Bom, para isso desejem-me sorte!

D para Depressão.

por AF, em 05.04.19

Ontem fez quatro meses que decidi mudar a minha vida e entrar para um tratamento psiquiátrico intensivo. Parece assustador não é? "Tratamento psiquiátrico intensivo", "hospital de dia", "internamento parcial".

Mas sabem o que aprendi nestes noventa e cinco dias?

Nem sei por onde vos começar a contar.

Em primeiro lugar, temos que começar a descomplicar e a perder o medo da expressão "saúde mental". Aliás, não é desse conceito, deixem-me reformular: temos que perder o medo de falar de depressão, ansiedade, suicídio, distúrbios mentais, perturbações psicológicas e esses nomes todos estranhos que as pessoas normalmente fogem. Elas existem e uma enorme parte da população mundial sofre delas. Sem vocês saberem, podem estar no dia a dia a falarem com dezenas de pessoas que sofrem de perturbações mentais em completo silêncio.

Vamos aos números: mais de 12% das doenças que existem no mundo inteiro são de foro psiquiátrico e, dessa percentagem, 4,4% pertence a pessoas que sofrem de depressão. Directamente falando, isto significa que mais de 300 milhões de pessoas no mundo lidam com depressão todos os dias. Se quiserem algo mais chocante a principal causa de mais de 800 mil mortes todos os anos do mundo é a depressão.

A única coisa que vos deve preocupar ainda mais que isto é saber que dentro deste gigante aglomerado de 300 milhões de pessoas, um quarto recebe tratamento e apenas 10% deles é que tem um tratamento adequado. Se não vos apetece fazer contas, deixem-me ajudar: de 300 milhões de pessoas a sofrer, 75 milhões recebe tratamento e 7,5 milhões é que se sente realmente ajudada.

Em Portugal 22,9% das pessoas sofrem de uma perturbação psiquiátrica, isto é um quinto da população nacional e é muito mais do que vos possa parecer. Nós somos 10 milhões de habitantes neste país e 2 milhões e 290 mil pessoas estão a sofrer todos os dias com uma perturbação mental. Uma em cada cinco pessoas sofre. Estão a ver a gravidade?

E em vez de falarmos, de alertarmos, de educarmos e tratarmos tentamos censurar a palavra e fingir que nada acontece. Criamos adultos perturbados e disfuncionais que por sua vez vão ter filhos que vão crescer numa situação familiar que não é de todo adequada. Em vez de enfrentarmos o demónio de frente, estamos a reprimi-lo porque ele é um tabu.

No meio disto descobri uma experiência que me veio abrir tanto os olhos.

Ao início pensei que fosse para ter seguimento normal com umas quantas consultas de dois em dois meses ou algo do género. Até que me vi numa sala com psiquiatras, psicólogas e enfermeiras a olhar para mim, todos muito sérios. Estava numa entrevista. Só que não era de emprego, era pior.

Quando me disseram as palavras "hospital de dia" tive vontade de gritar. Primeiro porque sempre associei hospitais de dia a centros onde os velhinhos vão quando não têm nada para fazer e depois porque hospital psiquiátrico não é de todo apelativo ao ouvido.

A minha primeira reacção foi um forte "não" com letras maiúsculas e a negrito e com um ponto de exclamação enorme a pairar por cima da minha cabeça. Como isso não era visível vim para casa com uns dias para pensar se aceitaria entrar no programa ou não. Com um diabinho num ombro e um anjinho no outro lá me decidi que iria atirar-me de cabeça porque era tudo muito melhor do que esperar sentada por uma consulta de psiquiatria que nunca mais vinha. Lembram-se da história?

O tempo passou e a cada semana senti que me ia descobrindo um bocadinho mais. E tenho direito a tantas coisas que não vos passa pela cabeça. Tudo sem pagar porque é num hospital público. Para além do mais, de quinze em quinze dias tenho lá a minha família não só para verem como me vou dando mas também para resolver qualquer tipo de problema que eu sinta necessário tratar.

O que eu quero dizer com isto é que eu sei que este hospital de dia é um dos poucos que existem em Portugal e é sem dúvida o melhor que existe porque eu já ouvi várias pessoas e vários profissionais a dizê-lo.

Sei que no norte do país nem sequer existem estes programas e como aí também noutros lados menos povoados as pessoas vêem-se completamente sozinhas no que toca a ajuda e acompanhamento. O que me deixa triste é saber que para muitas dessas pessoas a vida chega ao fim.

Eu não sou a única a ter pensamentos maus. Não sou a única a cometer erros na vida e a querer desistir de tudo e para além de ter encontrado pessoas com as quais me identifico estou a encontrar-me a mim própria e isso é o mais importante de tudo. Descobri problemas na minha vida que eu nem sabia que existiam e que estavam a limitar-me de uma forma tão intensa que eu nunca imaginaria como solucioná-los.

Ainda não sei mas estou a caminhar para lá.

Não se iludam. Os pensamentos continuam cá. A dor e a tristeza profunda ainda não me abandonaram mas eu já consigo ver uma pequena luz ao fundo do túnel que tem um potencial enorme para crescer. Eu também tenho potencial para crescer, para me tornar numa pessoa melhor, uma pessoa mais forte.

Gostava que mais pessoas tivessem a oportunidade de fazer o caminho que eu estou a fazer agora e espero que no futuro exista uma luta maior pela saúde mental. Até lá vou tentar pôr-me boa para me juntar a essa batalha.

Mas de uma coisa podem ter a certeza, eu vou lutar. Seja por mim, seja por todas as outras pessoas que sofrem, eu vou estar lá na linha da frente a dar o corpo às balas se for preciso porque vou estar mais forte para proteger e dar a mão a quem está frágil e não consegue ter forças para lutar.

Sempre na esperança de que um dia Portugal seja um país com mais saúde e quem sabe mais felicidade.

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